segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

sSão

Olá, prazer,
Eu não quero você
Mas quero
Eu menti
Mas te quero sincero
Nada faz sentido
Mas 100% diz que sim
E por aí vai
O ciclo de contradições sem fim...

Desculpa, desculpa
Eu me ataquei e quero atenção
Você também se feriu de arco e flecha
Da seta inversa
Só a pena me atingiu, ninguém morreu
O desprezo nem percebeu
Resultado final: "Não".

Anos e anos
E ânus
Se é pra gente nunca se curar
que viva distante desse mundo urbano
Aprenda a linguagem de pedras, água, árvores
que vegete pra sempre
que do Sol se alimente.

Não quero aprender a ser humana
Não quero aprender a interpretar
mundos oníricos e vida social
Se de nada vai valer
Todos vamos sofrer e morrer 
Eu só quero entender como é ser, simplesmente.

Mas existe essa besteira de paz?

Se o ar já nos oxida
eu não quero mais doenças e preocupações
E coisas complexas que dificultam a vida
Nem quero batidas mais rápidas 
de um coração em contagem regressiva...



(...Zero.)

Não quero
(Quero!)
Quando morrer já virei
"Quero-quero"

ou qualquer pássaro, de qualquer canção
deprê
-ssão

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Chove, chove, chove. Faz cosquinha em mim. E aquele sorriso, cadê? Aqueles dentinhos... E o timbre coelhinho. A boca formava um coração. Meu abraço, um puro calor, e pontas. Quem conta, canta.

Acalenta minha memória, faz cosquinha e deixa a saudade em seu devido lugar. É difícil der...ramar

quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Aquilo que você gostava em mim: não era eu


Sabe o que é estar desconectada de si mesma?

Quem estiver assim exatamente agora, é capaz de nem saber me responder ainda. Só depois que iniciamos um caminho controverso em busca de legitimar a nossa verdadeira realidade, liberando um sofrimento velado, é que nos damos conta do quanto estavam produzindo em nós uma pessoa sem carne e sem osso, apenas imagem. Uma pessoa que não era eu, nem você, nem ela, nem ela. 

O quão dissimulada uma mulher é capaz de ser? O tanto quanto vocês, “companheiros”, forem capazes de ser manipuladores com ela, em prol de uma Garota Exemplar.

A identidade da Garota Exemplar pode ser estrita ou mais plural, dependendo da cultura e influências que recebe. Algumas mulheres podem se identificar com o que vou descrever em alguns aspectos, mas certamente não em todos. Na minha cultura e no meu mundinho particular influenciado por fadas e princesas, a Garota Exemplar podia ser branca, magra e, principalmente, com um rosto angelical. Ponto positivo pra mim. Sempre me elogiaram nisso. 

Você sempre gostou disso em mim. Essa garota podia ser “fofinha”. Quanto mais meiga, mais baixo e fino falasse, mais doce olhasse... mais amor, carinho e elogios eu receberia de você. Quando criança, sem problemas. De início não tive muitas dificuldades nisso de ser fofinha. De certa forma, isso até fazia parte do meu jeito – o que não tem problema nenhum. Porém, obviamente eu não fui sempre só assim. Quando os hormônios começaram a se multiplicar, e a pré-adolescente irritada e insegura, e que (pasme) falava palavrão, começou a disputar essa identidade… a coisa começou a mudar de figura. Você nunca me incentivou a buscar me autoconhecer melhor para passar por esses períodos de transição, e iniciação, à mulher. Eu tentei sozinha, com meu diário. Mas uma pulsão forte em mim queria ser pra sempre fofinha. Infantil. Felizes para sempre.

(Rabisquei muitas páginas tristes de desabafos, que supostamente não eram dignas desse diário. Forjei meus próprios finais felizes).

E então outras Garotas Exemplares não tão angelicais passaram a ameaçar meu imaginário inicial. Vocês também me confundiram, e passaram a ser mais de um “você” exigente. Agora um novo você queria que eu também fosse extrovertida, sexy, que meus peitos crescessem (como você elogiava a cada vez que notava alguma diferença de tamanho neles!), que soubesse fazer sexo oral, como uma menina madura, que pudesse perder a virgindade (com você, é claro!) com no máximo 15 anos. Eu ficava confusa sobre como agradar você dessa vez, sobre o que eu mesma queria, ou devia querer. Não atendi a toda essa soma de requisitos contraditórios, não fui mais fofinha, briguei, te rejeitei, lutei pelas minhas paixões, lutei pela minha liberdade, não perdi minha virgindade nem tão cedo quanto você queria, nem tão tarde quanto você achava que controlaria. Talvez tenha sido o período em que estive mais perto de mim mesma, antes de você me distanciar novamente.

Assumindo que eu nunca chegaria à Garota Exemplar extrovertida, gostosa, que fizesse parte da elite da zona sul do Rio de Janeiro, que fosse “pra casar”, que não tivesse pêlos, e nem muito ciúmes, eu comecei a me odiar e ficar obcecada por você. Meu estômago começou a revirar a cada iminência de morte do nosso relacionamento. Meu chão ondulava e isso me deixava enjoada. Vomitei. Várias vezes. A cada ataque de histeria que eu mesma com minha voz baixa e doce reprimia em minha garganta, mas meu corpo expelia em forma de vômito, febre e outros sintomas, eu mais me repelia da garota ideal pra você. E mais sofria punições por isso. Frieza. Egoísmo, falta de empatia. Vingança. Tudo isso vinha de você, depois que você descobriu que eu não era assim a garota mais casta de todas, pois fiquei com outros garotos, fiquei com teu amigo. E terminei punida e com muita vergonha de ser a louca. “Sai daqui e vai procurar se tratar, garota”. Foi assim que levei meu primeiro pé na bunda por você, foi assim meu grande fracasso como Garota Exemplar. Foi assim meu primeiro gaslighting.

Depois disso tentei me recuperar, mas ainda estava vulnerável demais pra encarar meu esqueleto sem fugir. A selva e as mães de todas as cachoeiras do mundo feminino me chamavam para uma cura com águas, eu ia, mas ainda resistia um pouco em mergulhar, com medo de não ser mais querida por “ninguém”. Você demorou a se manifestar novamente, e veio se aproximando aos poucos de forma mais sutil, ao notar que eu estava me fortalecendo, não era tão boba. Os seus ataques não me atingiam diretamente, mas à mulher que contava sua história antes da minha. Você achou meu ponto fraco. Os medos dela passaram a ser meus também naquela simbiose que não se rompeu direito na infância. E os nossos contos de fadas se esfacelavam bem diante dos nossos olhos. Mas fomos fortes. Mergulhamos juntas. Deixamos a morte-vida chegar, arruinar pra depois reconstruir tudo. Mas não escapamos de sermos abusadas novamente. Objetificadas. Punidas por sermos quem somos.

Quando eu senti na pele e no trauma os seus ataques, foi até mais fácil pra mim dizer “não!”, cortar pela raiz, apontar o dedo na cara. Mas sutilmente eu fui sendo levada a querer estabilidade emocional sendo finalmente a Garota Exemplar Feminista Livre e Bem-resolvida que qualquer companheiro que não fosse tão “machista possessivo à moda antiga” iria desejar. O mais difícil era identificar você crescendo dentro das pessoas que eu amava. Eu poderia então perdoar você por qualquer deslize compreensível de um “homem”, mas meu comportamento não poderia nem chegar perto de reproduzir as mesmas coisas. Iríamos fingir que partimos das mesmas condições, pra conferir o rótulo de IGUALDADE na nossa relação, finalmente apaziguada. Eu não precisaria brigar pra conquistar meus direitos, era só pedi-los. Quando fossem convenientes, você iria me conceder. Era só lembrar aquele tipo de garota ideal sendo apenas fofinha, doce, gostosa, tranquila, compersiva, explorar a sexualidade talvez com outras garotas...continuar agradando. Nunca reclamando, nunca apontando machismo em você, porque isso é uma injustiça, uma calúnia, logo com você! Eu estaria perdendo a cabeça de fazer isso, eu estaria sendo egoísta, cruel, controladora e possessiva se quisesse questionar algo no seu comportamento. Enquanto eu reclamasse, só ganharia de volta a sua frieza, o seu desprezo. Apenas a parte de mim fofinha e compreensiva era digna de ganhar seu reconhecimento, seu amor, seus elogios e carinho. Eu tinha que achar que tinha algo profundamente errado comigo. Aquilo que você gostava e alimentava em mim ainda era uma mistura mais seleta de características da Garota Exemplar que fui moldando ao longo da vida. Todo o resto de que me apropriei e construí, meus trabalhos intelectuais, meus trabalhos na periferia, as coisas que eu achava interessante na internet, as músicas, as teorias feministas, o esoterismo, os ciclos e menstruação, os pêlos e fluidos do corpo, não eram nem nunca seriam tão admirados assim por você. Talvez fossem apenas tolerados, na medida do possível. Na medida em que seus privilégios não fossem ameaçados e eu ainda pudesse te agradar e ser um porto seguro pra você, na figura doméstica (por isso é que minha falta de habilidades culinárias não te agradava, e você me chamava de preguiçosa. não estou nem mencionando a questão da maternidade: isso outras podem expressar melhor que eu). Pra você se alavancar, seguir livre, leve e dominante, como sempre foi, antes de eu nascer. 

Porque você não gostava e não gosta de mim. Não gosta de mulheres. Você odeia mulheres. Você mata mulheres. 

Pra eu me reconectar a mim mesma, pra eu não morrer, tive que começar a ser mais radical. Me distanciei de você e estou na busca por autoconhecimento e poder. Meus limites agora estão mais visíveis, os conflitos não podem mais ser escondidos, os abusos não podem mais ser silenciados. Eu não sou nem nunca fui nada daquilo que você gostava. A garota que você dizia amar e as que você busca em outros corpos femininos não existe.

O que existem são dissimulações sem carne nem osso. Ou eu, e nosotras, em pessoa, sobreviventes.

Pois nos aguente.


Inspirações: http://escrevalolaescreva.blogspot.com.br/2015/10/dez-coisas-sobre-gaslighting-como.html
http://www.revistacapitolina.com.br/o-mito-relacionamentos-sem-cobrancas/



segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Epifanias no transporte público

As músicas não têm fim. Só existe o instante em que passam a ecoar nas danças da memória.
Os sonhos não têm início nem fim. Eles apenas ganham forma quando o nosso corpo desiste da vigília, e se dissipam em nuvens branquinhas, quase transparentes, quando não há mais como sustentar fechados os olhos.
O tempo é isso.

terça-feira, 22 de setembro de 2015

Amor-À-Nat


É como esse brilho fosco
do Sol que não esquenta
É quando
nada mais entra
dentro de um corpo
chorando de cólicas.

É nosso útero, irmã,
Que revira
Que avisa
Nos avista
por dentro
E põe pra fora toda a violência
que já recebemos
sem conseguir dar em troca

Você está certa
Porque dói.
E eu não sou completa
Nem tenho melhor palavra
pra te consolar.
Mas estou aqui, aberta
Esperando quase a mesma chuva salgada
terminar de nos encharcar

Iremos nos juntar na
mesma terra.
E até lá
Todos os defeitos, todos os egos
poderão nos afastar...

Mas cante comigo, minha amiga!
Em prantos!
Deixe seu sangue vazar

Dá saudade seus olhos fortes,
doces, querida
que mostram uma alma
feminina, contorcida
mirando bem fundo
no suspiro do meu lar

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Histórias curam

Hoje sonhei com um querido amigo, que, irônico e gay, olhava o meu corpo (que estava diferente) e dizia: "Nossa, esse corpo de mulher, farto... quantas histórias, quantas curvas... sai daqui!"

É, é apropriado que a Mulher Selvagem/ Mulher-borboleta seja velha e corpulenta, pois ela traz o mundo dos trovões num seio, e o mundo subterrâneo no outro. Suas costas são a curva do planeta Terra com todos os seus frutos, alimentos e animais. Na sua nuca, ela traz o sol nascente e poente. Sua coxa esquerda guarda todos os pinheiros; sua coxa direita, todas as lobas do mundo. Em seu ventre estão todos os bebês que um dia ainda irão nascer.
Uma vez sonhei que estava contando histórias e sentia alguém dando tapinhas no meu pé para me incentivar. Olhei para baixo e vi que estava em pé nos ombros de uma velha que segurava meus tornozelos e sorria para mim. "Não, não" disse-lhe eu. "Venha subir nos meus ombros, já que a senhora é velha e eu sou nova." "Nada disso" insistiu ela. "É assim que deve ser". -  Trechos de Mulheres que correm com os lobos

sexta-feira, 24 de julho de 2015

Limpa


Mofo - nada de novo
Medo - caveira com cabelo
Fora - vamos jogar!
Deixar pra trás, ou passar
pra frente esse lixo
que alguém vai revirar

Amanhece rua suja
O caminhão que tritura
Aqueles fios de 5 anos atrás
Aquele rosto do galã
que nem sei se existe mais...

Se é limpeza, pode ser meia
O cheiro não sai por completo
Deixei acumular demais...
Não sei como fui capaz

Agora, esqueça.
já perdi
são pedaços mortos
que à terra podem servir

Mas eu volto,
e dou de cara na porta
Meu autoboicote, que diz:
- você não mora mais aqui.

Dormindo ao relento
Rede.
Vento.

Ainda bem que trouxe
Laranjas.
Ainda são minha cor
preferida

quarta-feira, 17 de junho de 2015

Carta aberta a você

Por Nina Oliveira

"Cuidarei de você.
Mas não quero te tornes dependente.
Amarei você.
Mas não quero que te sintas aprisionado.
Ensinarei você.
Mas não quero que te sintas em dívida.
Prefiro que te sintas grato.

Sei do teu encantamento e da tua admiração, mas não quero que me imagines um ser humano perfeito. Tampouco desejo me utilizar do poder que me atribuis em prol da minha existência.
Quero te ver um ser independente. Um ser capaz de reconstruir-se a partir da própria matéria quando quem amas vai embora. Eu digo isso, porque sei que cada um daqueles que amamos é um pedacinho da gente. E por motivos, que surgem de uma sacola mágica de motivos, essas pessoas saem da nossa vida. Cedo, ou tarde. Quando elas se vão, é necessário reconstruir a parte que elas levam consigo. É preciso fazer brotar braço onde havia braço, pé onde havia pé, pulmão onde havia pulmão. É preciso fazer isso com calma, é um processo doído, mas é uma dor necessária, portanto, nada de anestesia na reconstrução!

Assim como as alegrias, as dores são necessárias. Ainda assim, não desejo que meu amor seja mais uma dor.

Que meu amor te liberte.
Que te acolha.
E te dê escolha.
Que você fique enquanto puder e quiser.
Eu ficarei enquanto puder e quiser.
E se um dia, um de nós for, que o outro saiba se reconstruir."

quarta-feira, 3 de junho de 2015

Orgânica


Os fluidos têm insistido
em escorrer pra fora de mim

Insistem eles em se mostrar presentes
Estarem cores, textura, explícitas e aparentes
Manchando e molhando tudo
ao contato com minha pele.
Tudo, inclusive todos
que aceitarem tocar e enxergar
a mulher "suja", gosmenta, no cio
Chorando de amar
Se virando do avesso pra se autoabraçar
Transformando seu esqueleto
Em alguma
coisa.

Que voa.

Os fluidos enredarão meu casulo
de borboleta?


~~~versão 2


Orgânica

Fluidos vão insistindo
em escorrer de mim
Desejam eles
mostrar-se presentes
Estarem cor e
textura aparentes
Manchando tudo
que se aproximar

Alguns não vão enxergar
Além de minha sujeira
Meu choro é amor fluido
molhando a pele gosmenta

Aqui, viro do avesso
Para meu auto-abraço
Transformo meu esqueleto
Em algo mais escasso

que voa.

Fluidos enredam um casulo
de borboleta - ou de pessoa?

domingo, 31 de maio de 2015

Eu sou como as outras

Se é pra se definir, mulher, com um homem no centro e às custas de colocar outras mulheres à margem, que seja feito o manifesto: nem puta, nem submissa, nem traidora, nem traída, nem coadjuvante, nem estrela principal, nem sua escrava, nem sua sinhá. Carregamos esses fardos em todas, pra destruí-los e um dia se livrar - Eu sou como as outras.


Manifesto eu sou como as outras

(1) “Você não é ‘como as outras’”: esta frase foi internalizada em nossa socialização como um elogio; uma necessidade afirmativa de se diferenciar de outras mulheres. Mas o que esta frase revela?;
(2) Primeiro, é importante pensar: quem são ‘as outras’? As outras são todas as outras mulheres, que aprendemos a não identificar, como diz Simone de Beauvoir, como “seres humanos”;
(3) Não ser como as outras seria a possibilidade de ser reconhecida como um ser humano. E não como essa “mulher não humana”, cujas substâncias constitutivas seriam: "dissimulação, loucura, promiscuidade, burrice";
(4) Para sustentar essa identidade negativa da mulher, que nos é apresentada desde a infância, muitas mulheres com trabalhos relevantes são apagadas da história da política, filosofia, arte. De modo que acabamos reservando a admiração para os homens, que nos são apresentados como “grandes realizadores”;
(5) Aprendemos que homens devem ser admirados e que devemos nos diferenciar das mulheres;
(6) Mas quais são os impactos da manutenção deste pensamento tão naturalizado? Inicialmente, o não reconhecimento das vivências comuns de opressão entre mulheres, o que fragmenta, enfraquece e silencia nossas vozes. Dificulta a construção de uma representação com a qual tenhamos orgulho de nos identificar. Mantém a humanidade das mulheres nas mãos de homens, que decidem quem é ou não “como as outras”. É um pilar da dominação de gênero;
(7) E se quebrássemos este ciclo? Admirando também as mulheres em nossas áreas de atuação profissional, em nossa família, em nossos círculos sociais, nos aproximando de outras mulheres e percebendo nossas vivências comuns e nos afirmando também pela igualdade: eu sou como as outras;
(8) O primeiro passo é recusar a identidade negativa e desumana da mulher, que nos é apresentada/imposta;
(9) O feminismo “de internet” ajuda neste construção de identidades positivas. Não olhamos mais para as capas de revistas, mas para os nossos selfies. Não lemos mais como “agradar seu homem”, mas como nos empoderar.

Não precisamos de ninguém para falar por nós: seja através de memes, de relatos de vivência de opressão ou de leituras acadêmicas feministas, estamos encontrando nossas próprias narrativas. E construindo a nossa representação em nós mesmas e nas outras mulheres.

Sou como Simone, Frida, Audre, Angela, Assata, Emma, Rosa, Brunna, Daniela, Marina, Lu. Sou como todas as outras.

domingo, 17 de maio de 2015

novaidade


essepê
esse ipê
esse morro
esse som de pernambuco
meu ouvido já caduco
minha boca ainda mole
ainda mal sussura no que acredita
ainda engole...

senhorita, moça
flor, amor,
qualquer palavra tosca
entra em rima
entra em riso
não sublima
pois não é preciso
porque é só de saber
e apenas já tocou
e pra manifestar vaza nova em tudo junto:
timbre, textura, odor-sabor...
coisa estranha e simples essa vida,
quanto tanto já passou! (e não foi nada)
quanto desse nada que vez em quando não passa!
pois cai no lago medroso do "se repete"
e nos faz querer fugir, como se fosse monstruoso isso
que na verdade é só ciclo (e nos inverte)
transmutantes, seguimos em espiral
que encantemos mesmo, tudo isso
nunca será igual
ao mesmo tempo sempre parecerá
o amor
tão banal
mas seja, ora, dê a língua!
que nem quando a criança birra
em se mostrar indecente, inteligente
sendo boba em encontrar novos utilitários
pra tudo que já foi catalogado
como existente.

e é assim
que inventamos novas brincadeiras pras cidades rivais
que usamos palavras parecidas pra descobrir
como desfazer nós, distância entre os locais
como chegar e ir
e cheirar e rir
cada vez mais lindo, mais cheio, mais último e primeiro...
cada vez, como nunca mais

sexta-feira, 8 de maio de 2015

Anjos Mulheres - VI

Por Maria Teresa Horta


As mulheres voam
como os anjos
Com as suas asas feitas
de cristal de rocha da memória

Disponiveis
para voar

soltas...

Primeiro
lentamente uma por uma

Depois,
iguais aos pássaros

fundas...

Nadando,
juntas

Secreta a rasar o
chão

a rasar a fenda
da lua

no menstruo
por entre a fenda das pernas

Às vezes é o aço
que se prende
na luz

A dobrarmos o espaço?

Bruxas
pomos asas em vassouras
de vento

E voamos

Como as asas
lhe cresciam nas coxas

diziam dela
que era um anjo do mar

Rondo alto,
postas em nudez de ombros
e pernas

perseguindo,

pelos espaços,
lunares
da menstruação

e corpo desavindo

Não somos violência
mas o voo

quando nadamos
de costas pelo vento

até à foz do tempo
no oceano denso
da nossa própria voz

Sabemos distinguir
a dormir
os anjos das rosas voadoras

pelo tacto?

Somos os anjos
do destino

com a alma
pelo avesso
do útero

Voamos a lua
menstruadas

Os homens gritam
- são as bruxas

As mulheres pensam
- são os anjos

As crianças dizem
- são as fadas

Fadas?

filigrama cintilante
de asas volteando
no fundo da vagina

Nadamos?

De costas,
no espaço deste século

Mudar o rumo
e as pernas mais ao
fundo

portas por trás
dobradas pelos rins

Abrindo o ar
com o corpo num só golpe

Soltas,
voando
até chegar ao fim

Dizem-nos
que nos limitemos ao espaço

Mas nós voamos
também
debaixo de água

Nós somos os anjos
deste tempo

Astronautas,
voando na memória
nas galáxias do vento...

Temos um pacto
com aquilo que
voa

- as aves
da poesia

- os anjos
do sexo

- o orgasmo
dos sonhos

Não há nada
que a nossa voz não abra

Nós somos as bruxas da palavra.

quinta-feira, 16 de abril de 2015

Alma selvagem

Eu fui muito longe...passando batida por uma floresta. (Era floresta mesmo?)
Sei que há uma foz. Não sei muito sobre ela, pois seus vestígios são apenas líquidos que vazam por uma pequena fenda que se abriu em minhas veias. Eles gotejam: salgada lágrima, ferroso sangue, agridoce gozo. Mas pra onde eles vão? Cadê o curso desse rio? O vazamento só aparece em alguns momentos, mais frequentes ultimamente. Pode ser ao ouvir o gemido da sanfona em Cajuína, ou o timbre perfeito das vozes em coro dos doces bárbaros. Pode ser ao ver o Sol correndo atrás das árvores enquanto o ônibus se movimenta, pode ser o olhar fundo numa íris marrom cintilante. Poderia ser a cada segundo, por cada buraco, cada pequeno poro, mas o corpo arma barreiras de contenção pra que ninguém perceba minha alma chorando. Sim, é ela que diz: "Você foi muito longe. Venha logo me abraçar". Ela me chama de volta à floresta, e dessa vez eu quero parar lá. Aqui. E ao resto do mundo que tanto reclama, só posso ter mais a dar quando todo esse ciclo das águas for curado, e a foz puder jorrar.

segunda-feira, 16 de março de 2015

Genuínos

Do que mais pele tem na flor?
Do que mais reto tem nas asas?
Nos seus instantes, nem a cor
lhe sobra, nada

É só suspiro, inalação
do seu ardor, é só vapor
Eu viro água.

Ao mesmo tempo, é presença
É carnal na totalidade
imensa, profunda, e sem peso
Somos só, e tanto
 infinidade

Abro os poros, enchamo
Te chamo, te amo
mas saem urros, gemidos
e entram mais.
Cai a luz.
Genuínos animais

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

L

a lua que é de lua
não tem hora certa pra mudar
de fase
não precisa de sol ou planetas
que cubram/descubram suas metades
ela circula na imensidão negra
- ao encontro de certas gravidades
que sangram, giram, dançam, gozam
enquanto eles pensam ser só amizade

no coito de crateras
no amor entre duas esferas

as luas são de luas
e ainda amanhecerão nuas
nem que o dia as apague